NO CREPÚSCULO DE UM (DETESTÁVEL) CICLO HISTÓRICO
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No domingo, dia 17 de abril de 2016, data que será lembrada durante muito tempo, reuniram-se os membros da Câmara dos Deputados para decidir sobre o prosseguimento do processo de destituição da presidente da República (“impeachment”). Desde os lares mais modestos, até os mais abastados, os olhos estavam colados na transmissão televisionada do evento.

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Ronaldo Ausone Lupinacci*

No domingo, dia 17 de abril de 2016, data que será lembrada durante muito tempo, reuniram-se os membros da Câmara dos Deputados para decidir sobre o prosseguimento do processo de destituição da presidente da República (“impeachment”). Desde os lares mais modestos, até os mais abastados, os olhos estavam colados na transmissão televisionada do evento. O extraordinário interesse da população teve e tem razões da mais alta relevância, conforme será analisado no decorrer deste texto. Cada um dos parlamentares se expôs, assim, ao País inteiro, saindo dos restritos campos de mira das respectivas bases eleitorais. Diante de toda a Nação não haveria oportunidade para cambalachos ou consensos velhacos. Ao proferir seus votos um número enorme de deputados se reportou às crenças religiosas e às suas famílias. Estas alusões à religião e à família despertaram a ira de esquerdistas radicais, ponto este a ser fixado na memória pelo leitor para melhor compreensão daquilo que vou comentar mais adiante¹.

Ao final da votação foram apurados 367 votos favoráveis à destituição da suprema mandatária (71,53%), 137 votos contrários (26,70%), sete abstenções (1,36%) e, apenas, duas ausências (0,38%). A proporção do “sim” equivaleu a 2,67 vezes à do “não”. Estes números se mostraram muito próximos daqueles divulgados pelos institutos de pesquisa acerca da opinião dos cidadãos, deixando bem claro que os deputados (e os partidos políticos) quiseram comportar-se segundo a orientação de seus eleitores. O Senador Ronaldo Caiado atribuiu o resultado “às ruas e às redes sociais”. Vários partidos e deputados mudaram de posição depois de sondar a opinião pública, resistindo às ofertas de suborno.

Numa perspectiva superficial o resultado teria evidenciado, somente, uma estrondosa vitória política dos antigovernistas frente aos governistas. Em outra perspectiva, de largos horizontes, nos colocamos diante de um fenômeno de muito maior profundidade, e, de reflexos que exorbitam o diminuto diâmetro do “impeachment” em si mesmo e os da política.  Nisso devemos concentrar a atenção, porque diz respeito ao futuro imediato e remoto.

Com efeito, se pode dizer que está em curso uma mutação significativa, talvez decisiva, no rumo da opinião pública porque fenômenos análogos vêm se passando em quase todo o mundo outrora oficialmente cristão. E, se eu fosse exemplificar ocuparia todo o espaço deste artigo enumerando os países em que surgiram comportamentos coletivos correlatos. Por isso menciono apenas a manifestação denominada “Dia da Família” realizada em Roma no último dia 30 de janeiro que reuniu a espantosa multidão de 2 milhões de pessoas contra a união civil de homossexuais, evento que a mídia ignorou, e que, inexplicavelmente, não teve apoio (pelo menos ostensivo) nem do Vaticano nem dos bispos italianos, em sua maioria. Importa, então, analisar a referida guinada cuja característica principal consiste na resistência, na oposição categórica, de incontáveis povos às diretrizes que seus respectivos dirigentes pretendem seguir, mormente em questões de natureza moral.

Se, no caso do Brasil existe um inegável e multiforme descontentamento da população em relação ao governo de Dilma Roussef (e à classe política) em decorrência do caos que nos assola na economia, na segurança pública, na saúde, na educação, na logística, etc., é inegável também que há um componente ideológico (religioso e filosófico) na raiz da oposição cívica. Este componente se mostra muito intenso em setores minoritários, mas vivo, embora implícito, no pensamento da maioria. Estivesse tal maioria afinada com o pensamento do PT e de seus comparsas comunistas e socialistas não teriam ocorrido os repetidos e tonitruantes protestos populares, nem tampouco o apoio maciço ao “impeachment”. Onde se situa, portanto, o cerne do dissenso entre Estado e Nação?

O agrupamento político-ideológico liderado pelo PT e favorecido por outras agremiações partidárias propôs-se a implantar no Brasil aquilo que se entende por comunismo ou socialismo, mas – e, isso é de fundamental importância – através do processo de guerra psicológica designado por Revolução Cultural. Para ser mais preciso, visa o estabelecimento do socialismo autogestionário, cujo termo final é o comunismo. Como orientava Herbert Marcuse, um dos filósofos propulsores da Revolução Cultural que se desencadeou na França a partir do ano de 1968, para o êxito do processo se tornava necessário substituir a Política pela Psicologia, pois “o que se deveria empreender é uma espécie de difusa e dispersa desintegração do sistema” (no livro cujo título, em vernáculo, seria “A Sociedade Carnívora”). Para Marcuse era necessário substituir a noção histórica de revolução e a estratégia histórica de revolução porque as revoluções meramente políticas não haviam conseguido seus propósitos de mudar o homem, e, principalmente eliminar todas as desigualdades sociais. O primeiro e fundamental alvo da Revolução Cultural reside na destruição da família, fonte de todas as desigualdades, e, nisso, em primeiro lugar as desigualdades oriundas do sexo. Para não alongar muito cabe dizer, sumariamente, que o final do processo revolucionário – ou pelo menos seu objetivo visível – consiste na sociedade tribal concebida pelo estruturalismo de Claude Lévi-Straus, onde iria imperar a comunidade de bens e a comunidade sexual, vale dizer a supressão do direito de propriedade e o amor livre. Mas, para isso seria imprescindível destroçar as últimas reservas morais da sociedade, através do feminismo, do aborto, do homossexualismo, da contracepção, da eutanásia, e, mais adiante, da pedofilia e da zoofilia. A coletivização dos bens deveria seguir em marcha lenta, para não despertar hostilidades. Outras revoluções culturais ocorreram no passado (a do Renascimento e do Humanismo), mas nenhuma com a amplitude, o radicalismo e a fartura de recursos de comunicação e de tapeação como esta.

A referida utopia foi transformada em programa político pelo Partido Socialista Francês a partir do ano de 1981, e, mais ou menos na mesma época pelo Partido Socialista Operário Espanhol, que se gabava de sua revolução “silenciosa”, isto é, pouco percebida pela opinião pública. De lá foi importada para nossas terras brasílicas como informou o ideólogo do PT Paul Singer, pelos exilados que retornaram com a “abertura política”. Na Revolução Cultural, o elemento político aparece como um auxiliar da propaganda tendente a modificar as mentalidades e os comportamentos. Atua para “liberar energias” como diziam os socialistas espanhóis, empenhados em anestesiar, amordaçar e extraviar seus compatriotas. Á falta de alguma experiência histórica do “transcomunismo”, ou “neocomunismo”, os revolucionários se ocuparam em explorar distantes analogias entre seus devaneios e os povos primitivos (da América, África e Oceania), inserindo em suas arengas o culto ao modelo de sociedade indígena, explicando-se por aí toda a celeuma criada por ambientalistas-ecologistas contra a civilização capitalista industrial.

O andar da Revolução Cultural – que caminha no Brasil também nos programas educacionais do Governo, como denunciou recentemente o historiador Marco Antonio Villa²- teria de ser lento e gradual segundo seus estrategistas, abrangendo um período de 20 a 25 anos, ou seja, o espaço de uma geração. Entende-se, assim, que suas principais vítimas seriam as crianças e os adolescentes, que procurariam distanciar das tradições, ideias e costumes advindos de seus antepassados³. Neste sentido se propuseram, também, a “reescrever” a História omitindo fatos e falsificando outros.

Porém, em que pese a perda de grande parcela da “defesa imunológica” frente aos desvarios da Revolução Cultural – devido, sobretudo, à crise que se instalou na Igreja Católica a partir do Concílio Vaticano II – sobreviveu no mundo ocidental, como brasa oculta, a lembrança do passado cristão, e isso veio criando um mal-estar crescente em relação ao ambiente impregnado de toxinas revolucionárias. A brasa ainda não se transformou em labareda, mas as múltiplas reações em tantos países indicam que estamos no final de um ciclo, não apenas de mando político do PT, mas de rejeição àquilo que aquele partido-seita – e seus aliados e assemelhados – significam e representam em termos de cosmovisão, e, portanto de conduta individual, de organização social, de cultura enfim porque a cultura concerne a todas as atividades humanas. Daí o desconforto e o desânimo dos revolucionários com o crescimento da direita(4). Já estão antevendo que seu projeto de destruição, em fase crepuscular, irá por água abaixo.

* O autor é advogado e pecuarista.

¹https://leonardoboff.wordpress.com/2016/04/18/um-golpe-parlamentar-e-a-volta-reacionaria-da-religiao-da-familia-de-deus-e-contra-a-corrupcao/

²http://oglobo.globo.com/opiniao/a-revolucao-cultural-do-pt-18407995
³http://g1.globo.com/hora1/noticia/2015/09/drogas-e-sexo-no-meio-da-rua-sao-cenas-comuns-nos-pancadoes-de-sp.html
(4)Por exemplo, em http://cartamaior.com.br/?/Editorial/O-day-after-do-Brasil-sera-na-rua/35917

Jornal Nova Fronteira