AMOR DE INFÂNCIA
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No meu tempo de estudante, tive companheiro, que se tornou intimo amigo. O jovem fora bafejado com traços apolínicos, mas não primava pela inteligência; e somava à desdita, o facto dos pais serem da classe média baixa.

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HUMBERTO PINHO DA SILVA – Porto, Portugal

No meu tempo de estudante, tive companheiro, que se tornou intimo amigo. O jovem fora bafejado com traços apolínicos, mas não primava pela inteligência; e somava à desdita, o facto dos pais serem da classe média baixa.

O rapaz conhecera menina, e apaixonou-se. A moça, não sendo de família nobre nem endinheirada, tinha “nome”, e o bastante para parecer rica.

A rapariguinha, inexperiente na arte de amar, engraçou com ele, demonstrando afeto no olhar, atitudes e atenções.

Deu-se o caso das famílias serem amigas e visitarem-se mutuamente – nessa recuada época era uso fazerem-se visitas e retribui-las, – e as mães, possuidoras de apurada sagacidade feminina, descobriram ou desconfiaram dos encontros furtivos e dos olhos risonhos e brilhantes dos filhos.

A mãe do mocinho rejubilou de alegria, mas o mesmo não aconteceu com a mãe da jovem. Porém, a prudência, aconselhava não revelarem os pensamentos e desejos.

Certa tarde de Primavera – estavam os pequenos nas férias da Páscoa, – encontraram-se para tomarem chá e provarem o bolo de chocolate, feito com receita nova.

A mãe da moça, encaminhou, habilidosamente, a conversa para casamentos.

Disse, que gostava que a filha casasse com médico, pois queria ter na família alguém formado em medicina… A menina, ainda era jovem para pensar nisso – esclareceu, – mas é sempre bom cuidar desde já. Não vá ser enganada por caçador de dotes…

O rapaz, que tudo ouvira em silêncio, veio contar-me com a tristeza no rosto.

Tocou-me de profunda amargura, o coração, ao confidenciar-me:

– “Se pudesse iria para medicina! …Mas sou burrinho! …Não sirvo para nada!…”

Certo é que a menina esfriou, deixando de corresponder aos ternos olhares do rapazinho; talvez por recomendação materna.

Os anos correram, correram e correram…

Numa tarde chuvosa de Inverno, encontrei o Manel, descendo os “Clérigos”.

Disse-me que casara e tinha um garotinho de cinco anos.

Falei-lhe da Bélinha. Ficou muito sério, com olhar de espanto, e esclareceu-me, que casara, também.

– “Sabes?… – Confidenciou-me, – nunca a esqueci! Foi paixão entranhada; das antigas! …Daquelas que se cravam no coração… e para sempre ficam…”

Coitado do Manel! …Se tivesse um pouco mais de inteligência e algum dinheiro no bolso ou na bolsa, teria sido o marido ideal da Belinha; a feitiçeirinha que o encantou.

Jornal Nova Fronteira