REMÉDIOS PARA UMA ECONOMIA EM FRANGALHOS
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É de se acreditar que a classe média brasileira não queira descer ao patamar de miséria de sua similar da Venezuela (da qual, integrantes têm sido vistos catando comida no lixo de restaurantes), país cuja moeda (bolivar) até os ladrões rejeitam, segundo noticiou o New York Times. Mas, para que isso não venha a acontecer,

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Ronaldo Ausone Lupinacci*

É de se acreditar que a classe média brasileira não queira descer ao patamar de miséria de sua similar da Venezuela (da qual, integrantes têm sido vistos catando comida no lixo de restaurantes), país cuja moeda (bolivar) até os ladrões rejeitam, segundo noticiou o New York Times. Mas, para que isso não venha a acontecer, é preciso reagir energicamente de forma a deter o processo de empobrecimento, ou, preferivelmente contra-atacar mediante providências regeneradoras. Neste sentido, a Folha de S. Paulo noticiou que jovens compatriotas “cansados” do “pensamento marxista e estatizante” vêm promovendo a difusão da doutrina liberal em universidades e escolas (24/10/2015). A matéria, elaborada por Jacques Constantino, se reporta às teses de Milton Friedman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 1976, sobre as virtudes do mercado livre e as mazelas da atuação intervencionista do Estado.

Esta coluna não é adepta da filosofia liberal. Contudo, existem importantes pontos de contato entre a doutrina social católica e a escola neoclássica (neoliberal ou neocapitalista) acerca dos princípios básicos do funcionamento da economia, sobre os quais se falará mais adiante, embora ocorram, também, divergências que não serão aqui analisadas. Para a doutrina da Igreja a riqueza não deve ter o caráter de obsessão, constituindo, porém, a prosperidade geral meio necessário do aprimoramento civilizatório e cultural. E, a prosperidade geral não se realiza sem a prosperidade dos indivíduos.

Outro economista aquinhoado com o Prêmio Nobel havia constatado que a implantação da economia dirigida consistia em tentativa de estabelecer a igualdade patrimonial, o que só poderia resultar em desigualdade oficialmente imposta (Friedrich A. Hayek, em “O Caminho da Servidão”). Embora o igualitarismo – valor metafísico do comunismo e do socialismo – não constitua o tema deste artigo, a advertência vem a propósito, para mostrar como erros de concepção filosófica se alojam na raiz de desastres sócio-econômicos, até porque costumam se achar atrelados a erros de estratégia.

Antes de ingressar no exame dos princípios, cumpre realçar com grande ênfase que sua aplicação prática nas atuais circunstâncias requer, ao mesmo tempo, firmeza e prudência, o que significa a necessidade de sincronizar as diversas medidas com sabedoria para conciliar ciência e arte. Não é exequível uma correção completa, rápida, e indolor. Temos pela frente a eliminação de erros acumulados desde o Estado Novo getulista. Cabe lembrar, ademais, que um plano de salvamento econômico enfrentará resistências, desde aquelas aninhadas na mentalidade deformada por décadas de estatismo (doutrina e prática de intervenção do Estado no campo econômico) e de demagogia, até aquelas ancoradas em vantagens pessoais ou setoriais descabidas.

O cerne da temática diz respeito aos princípios. São três os princípios básicos de economia política sadia: a) o da liberdade de empreender (livre iniciativa); b) o da inviolabilidade do direito de propriedade privada; c) o da competência dos particulares (indivíduos e empresas) para mover a economia, (princípio da subsidiariedade). O primeiro enaltece a criatividade, elemento propulsor do progresso e da eficiência do agente econômico. O segundo garante a produção de riquezas, na medida em que o homem se move pelo estímulo dos previsíveis resultados, isto é do lucro de seu capital ou do fruto de seu trabalho, ou de ambos. O terceiro princípio, por si só repele, a intervenção dirigista do Estado, reservando-lhe somente o dever de atuar subsidiariamente, isto é, naquilo que os particulares não podem fazer. Advém da palavra subsídio, na acepção de auxílio.

Do que foi exposto resulta uma primeira consequência: não devem existir empresas estatais, salvo excepcionalmente (não serão analisadas aqui as hipotéticas exceções). Logo, as estatais brasileiras, a começar pela Petrobrás devem ser privatizadas, obviamente através de processo limpo. Também não pode o Poder Público interferir no curso normal da economia através de estímulos artificiais ou penalizações, ambos setorialmente orientados. Assim, não se justifica, por exemplo, a existência de Bancos estatais ditos de fomento, tais como o BNDES, tanto mais quando sua atuação tende à formação de monopólios ou oligopólios (nos ramos frigorífico, cervejeiro ou telefônico, por exemplo), ou ao uso político para troca de favores. A lógica de mercado, que rege a atividade dos Bancos privados saberá detectar os setores nos quais o investimento é racional.

Numa segunda linha de ação, será necessário recolocar o Estado em sua dimensão natural, vale dizer aquela limitada por sua missão específica: relações exteriores, segurança interna e externa, e administração da justiça. Nesta frente se exigirá cirurgia de grande magnitude para eliminar programas nefastos (a Reforma Agrária, por exemplo), órgãos inúteis (o INCRA, consequentemente, entre outros), e cargos públicos dispensáveis, sem falar na exclusão de regalias, do restabelecimento da disciplina, e, da institucionalização da meritocracia. O funcionalismo cresceu 30%, e os cargos de confiança aumentaram 38% nos últimos quinze anos. A extirpação de tais tumores terá como principal efeito a redução drástica da tributação, de modo a permitir a geração de lucros, a formação de poupança, a realização de investimentos, em suma, a formação de capital, sem o qual não há riqueza. Tudo isso precisará ser implementado com habilidade a fim de que o setor privado possa, gradativamente, atrair e absorver a mão de obra ociosa oriunda da desestatização e da supressão de empregos públicos. Do início da década de 90 até agora a mordida tributária do Poder Público no PIB saltou da faixa de 20% para 37% ou mais. É desejável que seja reduzida, digamos a 10% ou até menos.

Hoje ninguém desconhece que a Previdência Social está fadada ao colapso não só no Brasil, mas até mesmo em países ricos, como é o caso dos Estados Unidos. A desmontagem progressiva da Previdência Social corresponde a outra cirurgia melindrosa, lenta e gradual, mas indispensável, concomitante à estruturação de substitutivos com os quais os cidadãos possam dispor de recursos financeiros quando já não puderem integrar o mercado de trabalho.

Impõe-se a reforma da legislação trabalhista, de modo a prestigiar o contrato, com ênfase para a liberdade de contratar, e, ao mesmo tempo reduzir os custos para os empregadores, fator que corrói os lucros e favorece o desemprego. No Brasil um empregado custa 116% além do seu salário, ao passo que a média mundial fica situada na faixa entre 30% e 35% da remuneração. Os encargos excessivos (FGTS, INSS, adicional de férias, etc.) obrigam os patrões a reduzir as vagas de trabalho, além de restringir os lucros. Os custos fiscais e trabalhistas convergem, também, para tornar o empresário escravo do sistema financeiro.

O gigantismo do Estado, seu furor intervencionista, a voracidade fiscal, a antipatia ao direito de propriedade e à livre iniciativa, com intermináveis exigências de registros, licenças, declarações, autorizações, obrigações tributárias acessórias, geraram o que se designa por burocracia. Inútil, onerosa, asfixiante, parasitária, despótica, ela trava o dinamismo da economia, que depende da agilidade de seus atores. No Brasil o cumprimento das exigências fiscais consome do empresário 2.600 horas-ano ao passo que na Austrália apenas 105 horas-ano. Assim, mostra-se imprescindível uma limpeza completa naquilo com que o Estado nos amarra através do emaranhado caótico de leis, decretos, instruções normativas, resoluções, circulares, portarias. Tomem-se, por exemplo, os rigores draconianos da legislação ambiental, o cansativo ritual para abrir, manter, ou extinguir uma empresa, e se verá quanto prejuízo a excessiva regulamentação causa para a prosperidade.

Liberado do fardo de suportar astronômicos gastos com o funcionalismo, com despesas previdenciárias, com o capital improdutivo aplicado nas empresas estatais, dentre outras distorções, o Estado poderá desempenhar melhor sua missão natural, inclusive na esfera subsidiária que compreende a implantação de vias de comunicação e escoamento (ferrovias, rodovias e hidrovias), portos e aeroportos. E, diminuirão as chances da corrupção que nos consome, segundo a ONU, 200 bilhões de reais por ano.

Não há espaço para polemizar com os defensores de “programas sociais”. Fica para outra ocasião. Adianto, todavia, que salvo aqueles indispensáveis, emergenciais e transitórios todos os demais são nocivos sob vários pontos de vista. Inclusive do ângulo político, por integrarem os mecanismos de compra de votos nas eleições. Ao Estado não compete distribuir ou redistribuir a riqueza, mas apenas facilitar sua difusão orgânica, com a exigência de rigorosa observância por todos dos preceitos decorrentes da justiça e da equidade inseridos em leis sábias.

*O autor é advogado e pecuarista.

Jornal Nova Fronteira