Indevido Imposto de Renda na doação e transferência causa mortis
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No próximo dia 30 de abril se encerra o prazo para as pessoas físicas declararem o seu imposto de renda. Não é de hoje que os brasileiros reclamam da fome do leão, sempre insaciável, o problema é que a carga tributária além de excessiva contém ilegalidades que contaminam ainda mais a sua cobrança.

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Por Cristiano de Freitas Fernandes

No próximo dia 30 de abril se encerra o prazo para as pessoas físicas declararem o seu imposto de renda. Não é de hoje que os brasileiros reclamam da fome do leão, sempre insaciável, o problema é que a carga tributária além de excessiva contém ilegalidades que contaminam ainda mais a sua cobrança. Nesse sentido, trataremos aqui de uma dessas ilegalidades, já plenamente reconhecida pelos tribunais brasileiros, mas que continua sendo praticada por algumas unidades da Receita Federal. Trata-se da cobrança de imposto de renda sobre o ganho de capital oriundo da transferência de bens a valor de mercado ocorrida na doação por adiantamento de legítima e na transmissão de bens aos herdeiros quando do falecimento do autor da herança.

O fato é que o parágrafo primeiro, do artigo 23, da Lei 9.532/97 prevê que: se a transferência for efetuada a valor de mercado, a diferença a maior entre esse e o valor pelo qual constavam da declaração de bens do de cujus ou do doador sujeitar-se-á à incidência de imposto de renda à alíquota de quinze por cento. Já a cabeça do artigo 23, faculta que a doação e a herança podem ser realizadas com o mesmo valor constante da declaração de renda do de cujus ou do doador ou ainda a valor de mercado. Apenas nesta última hipótese é que a lei prevê a cobrança do imposto de renda.

De início poder-se-ia imaginar que então a solução seria sempre realizar a doação e a transferência da herança com o mesmo valor da declaração do autor da herança. Todavia, é preciso que reste claro que neste caso quando os donatários ou herdeiros pretenderem vender o que receberam a este título, havendo diferença a maior, tal diferença será regularmente tributada pelo imposto de renda sobre o ganho de capital; ao passo que, caso a transferência dos bens por herança ou doação tivesse ocorrido a valor de mercado, muito provavelmente não haveria diferença a tributar ou essa diferença certamente seria bem menor quando da efetivação da venda posterior, ou seja, a carga tributária seria muito menor.

Como visto, e de qualquer forma, o problema é que quando os donatários ou herdeiros recebem os bens doados ou herdados a valor de mercado, a previsão legal também é de cobrança do imposto de renda sobre o suposto ganho de capital. Entretanto, falhou a lei neste aspecto, visto que a doação e a transferência da herança já são tributadas pelo Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) fato que torna absolutamente inconstitucional a previsão legal do parágrafo 1º, do art.23, da Lei 9.532/97 visto que o inciso I, do art.155, da Constituição Federal reza que compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre a transmissão de bens causa mortis e doação. Ou seja, quando a referida lei previu que a União Federal poderia cobrar imposto de renda sobre o mesmo fato gerador do ITCMD (a transmissão causa mortis e doação), contrariou frontalmente a Constituição instituindo ilícita bi-tributação. Por isso é que a liberdade conferida na cabeça do art.23, da Lei 9.532/97 dos donatários e herdeiros de realizarem as referidas transmissões de bens seja a valor de mercado seja a valor idêntico ao declarado pelo doador ou de cujus não poderia ser tributada tal como previsto no parágrafo primeiro do mesmo artigo. Nesse sentido, desde agosto de 2007, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região pacificou o entendimento quando, através de sua Corte Especial, acolheu arguição de inconstitucionalidade e declarou inconstitucional o parágrafo primeiro, do art.23, da Lei 9.532/97.

E, como as unidades da Receita Federal que continuam na contramão do decido pelo TRF da 1ª Região, não modificam seu entendimento, em tese, caberia recurso ao CARF, Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Mas, em razão da Operação Zelotes, da Polícia Federal, que desvendou esquemas de corrupção naquele órgão, o CARF suspendeu todos os seus julgamentos até o final do ano de 2015, o que força o contribuinte a ajuizar a competente ação tributária na Justiça Federal, inclusive sendo cabível a tutela antecipada para suspender a cobrança do tributo em tela e para que seja emitida a competente certidão positiva com efeitos de negativa.

* Advogado, pós-graduado em Direito Tributário e Processo Civil, Mestrando em Direito Tributário, Conselheiro da OAB/DF e Presidente da Comissão de Direito Empresarial da OAB/DF

Jornal Nova Fronteira